Dominique Miller[2]
Ser mulher não é natural. A feminilidade é, por estrutura, associada ao desconhecido.
Que a condição feminina tenha sofrido desde sempre uma segregação social discreta, mas determinada ou declarada e assumida, é o reflexo de uma impossível integração da feminilidade no espírito humano. Isso deu lugar a repressões frequentemente ferozes que, para algumas, se perpetuam: processos de bruxaria, excisões, raptos de guerra, lapidações, crimes de honra, véu integral, constrição ao matrimônio, violências conjugais, prostituição forçada etc. Foram necessários combates repetidos, decididos e amiúde dolorosos para que essa metade do gênero humano tomasse seu lugar. É suficiente examinar a composição do Conselho de Segurança da ONU, da Liga Árabe, do G20, de qualquer outra câmara de representantes de um país, ou considerar os responsáveis pelas finanças no mundo, os campeões esportivos ou ainda os artistas renomados no mercado da arte para constatar o limite que encontra a igualdade, para as mulheres, no campo social.
A psicanálise conhece a ameaça que o enigma do feminino representa no inconsciente. Não sabemos ser mulher. Não queremos saber nada disso: nós o execramos ou exaltamos. É, vez por outra, uma “danação”, um “handicap”, uma “lacuna” ou um “presente do céu”. Os analisantes e as analisantes fazem parte de um combate ao qual a singularidade feminina os expõe.
Qual singularidade? “A mulher não existe.”[3] O teorema de Lacan sobre a não essência feminina é irremediável. Simples, lapidar, ele provoca, subjuga, faz lei. Nós o repetimos até a exaustão sem jamais modificar a ordem das palavras, tanto que elas nos alienam. Poderia se escrever amulhernãoexiste, formando assim um neologismo que tivesse a força de um significante-mestre. A potência do seu enunciado é suficiente para deixar emudecido aquele que o escuta e pronuncia. Isso ocorre em todos os sentidos, em todos os golpes. O gênio de Lacan se deve àquilo de que ele foi capaz: resumir, em quatro palavras, uma complexidade universal do gênero humano. Uma verdade insuportável está contida aí, que toca a cada um desde sempre.
A solução fálica
“A mulher não existe” – o que isso quer dizer? Essa pergunta praticamente sempre vem ao espírito assim que passa o momento de vacilação. É preciso preencher de sentido a fenda aberta. Como fazer escutar que há no inconsciente uma diferença sexual, ainda que ela não seja simbolizável? Com efeito, no inconsciente existe um “há” que define uma parte do gênero humano e um “não há” que define a outra. Do lado masculino, um significante maior representa seu gozo, o falo. E do lado feminino? Não há significante que especifique o gozo de A mulher no inconsciente. Daí o enigma do feminino e seus efeitos sobre os seres falantes. Gostaríamos que existisse uma definição desse A que nos propusesse uma observação sobre aquilo que ela é e o que ela quer. Gostaríamos, em paralelo, que fizesse homem e mulher iguais face à representação inconsciente. “A mulher não existe” abre um furo no universo inconsciente dos homens e das mulheres, aí onde esperamos uma simetria entre eles.
É a causa maior dessa outra verdade enunciada por Lacan, que faz escândalo: “[…] a revelação que nos é fornecida pelo saber do neurótico não é outra coisa senão isto, que é articulado: não há relação sexual”[4]. A disparidade na relação se impõe aí onde amaríamos identificar o que torna um homem viril e a uma mulher feminina.
Freud compreendeu imediatamente que a libido, padecendo dessa disparidade entre meninos e meninas, homens e mulheres, condensava sua capacidade de satisfazê-los sob um único representante: “[…] para ambos os sexos, apenas um genital, o masculino, possui um papel. Portanto, não há um primado genital, mas um primado do falo [Phallus]”[5]. Afinal, essa definição do gozo comum aos dois sexos tem alguma coisa de desconcertante – porque ela anula a diferença –, mas também alguma coisa de tranquilizador, já que ela reúne os dois sexos em um único terreno. Contudo, as mulheres foram premiadas com um lugar de gozo que, naturalmente, deveria pertencer aos homens. O falo é um representante do instrumento corporal do gozo masculino: o pênis. Elas não o têm. A falta é o que se impõe para elas na sua relação com o gozo. Uma falta irreversível, radical, que Lacan designa com o nome de privação, colocando o acento na subtração que o inconsciente interpreta. Quer dizer que, de maneira evidente, ser mulher é associado a uma falta maior de gozo. Pois, o gozo fálico ao qual elas recorrem é, de todo modo, um desvio em um universo que não lhes é homogêneo.
Entretanto, se a solução fálica é acessível às mulheres, é porque o falo representa na estrutura o papel de representação significante. “Com efeito, é precisamente com o semblante do falo que se relaciona o ponto pivô, o centro de tudo o que se pode ordenar e conter do gozo sexual.”[6] Ele significa tanto para as mulheres como para os homens um poder de satisfação, porque ele faz crer em uma coincidência entre o símbolo e a satisfação corporal que a turgência viril representa. Isso indica de passagem que, para os homens, esse órgão significantizado é, certamente, cativante, mas também descartável. A angústia, a impotência, a fobia, a adição sexual, o donjuanismo, são efeitos simbólicos no homem desse destino simbólico do falo. Nem tudo é rosa para eles também não!
O valor de semblante do falo é o que permite às mulheres imaginar-se tê-lo ou sê-lo. Há um bom número de mulheres que se satisfazem dessa posição fálica para preencher sua satisfação feminina. A teoria freudiana do pênisneid feminino explica isso, mas de uma maneira paradoxal: com as mulheres estando sempre insatisfeitas. Lacan também sublinha isso definindo o desejo histérico como desejo de insatisfação. Elas sabem, mais que os homens – que são enganados pela sua realidade corporal –, que o falo não pertence a ninguém. De fato, elas se satisfazem de uma insatisfação repetida do artifício fálico, preservando seus corpos, defendendo o lugar da falta que marca seu gozo. “Mascarada”, dizia Joan Rivière[7]. Elas jogam com o falo graças aos enganos imaginários que as vestimentas corporais, os enganos amorosos, os dons maternos, as posturas da atividade social mantêm.
Duas vias do falicismo
Existem para a histérica dois domínios privilegiados por onde seu falicismo permite jogar o jogo do gozo.
Em primeiro lugar, a maternidade. Fazendo aí a experiência da perda de um objeto real saído das suas entranhas, como falo, ela se reapropria dele pelo amor, pelo fantasma e pela identificação. Uma criança, nós a adotamos. O amor maternal não tem nada de instintual. O poder do falo desdobra para ela todos os graus do prazer e do seu mais além; ele alimenta seus fantasmas de realização pessoal ou de aniquilação. Ela o faz seu, embora sabendo, no sentido do inconsciente, que ele guarda em si todas as insígnias da falta, da separação e da perda. Da simbiose adesiva à pura indiferença, o amor materno conhece todos os graus de um laço complexo que alimenta nas mulheres um sentimento de plenitude assim como de culpabilidade. O falo faz da criança, no registro imaginário, o lugar de todas as projeções maternas. E o real remete as mães à ordem da feminilidade, aquela onde o falo não preenche a falta radical. Sabemos que o estrago materno faz parte das experiências humanas mais correntes.
O segundo domínio essencial do falicismo feminino põe em jogo a relação de uma mulher com o corpo do homem que ela ama. Esse corpo representa o papel de um instrumento de gozo, ainda aí objeto descartável que não lhe pertence, mas que o homem lhe empresta. Ela empresta a esse corpo o tempo do abraço. Trata-se, então, a verdade da sua falta que estimula seu desejo. Ela ama que ele a envolva, que a cubra, que lhe faça experimentar sua abertura quando ela o embainha. É como separado que esse corpo lhe procura esses gozos. Por vezes ela chora. Sabemos que são numerosas as mulheres que não podem considerar sua existência senão acompanhadas por um homem. Além disso, na histeria, uma mulher pode desejar dois destinos para o homem. O primeiro, fatal, em que ela o verá bem castrado para que ele também seja privado. O outro, em que ela sente ciúme, imaginando-o raptado por outra mulher, sobre quem ela gosta de dizer para si mesma que conhece melhor do que ela o gozo feminino. Marguerite Duras nos demonstrou graças a Lol V. Stein que é ela que, no seu ciúme, está propriamente falando encantada.
“Então, me dizia uma paciente que acabara de escapar do duplo sonho de se tornar dançarina e cantora, como sair da mascarada feminina, para ser uma verdadeira mulher?” A questão tem o mérito de ser colocada nesses termos, indicando que a mulher que aloja todo seu gozo só no falo está perdendo uma parte de si mesma.
No entanto, embora mascarada, o poder fálico lhes é essencial – que elas se apeguem a ele, invejem-no ou neguem-no. Uma vez que atenua o defeito do ser. Saber, poder, prestígio, sucesso, invenção, a lista é longa de benefícios que as tentam. Mas também, à falta de tê-lo, elas adicionam os objetos do mundo, investidos pela pulsão fálica. As figuras atuais de chefe de empresa, da mulher política, da star e da top-model se querem modelos femininos. Por vezes, mais fálicas que os homens! À falta de ser verdadeiras mulheres – isso que elas pretendem –, elas fazem o homem, dizia Lacan.
Um gozo suplementar, nos limites da linguagem
No entanto, algumas mulheres, em que o fervor fálico se materializa como empuxo ao absoluto, colocam a questão de sua única adesão fálica no seu modo de gozo.
É assim com aquelas que fazem do amor do pai seu motor. Resolução inflexível e dom de si mesmas acompanham seu engajamento pela causa paterna, a tal ponto que renunciam a todo outro prazer. Seu juramento íntimo e silencioso reassegura seu semblante de ser. Penso em duas mulheres célebres: a primeira Elizabeth da Inglaterra e Aung San Suu Kyi, opositora birmanesa, prêmio Nobel da Paz. Esse amor ultrapassa qualquer outro laço, marido, amantes, filhos e parece se nutrir de uma identificação imperativa à qual elas se devotam de corpo e alma.
Há também aquelas que não mostram menos fervor – erótico dessa vez – por corpos de homens anônimos. Nós as chamamos de ninfomaníacas ou hipersexuais. Aqui, não estamos no registro do amor. Elas testemunham gozos feitos de inflamação e do dom de si. Uma analisante me confia sua exaltação quando ela se despe e se torna “uma outra que não se pertence mais”, franqueando fronteiras difíceis a cernir, “abandonada às carícias e a esse corpo masculino que a arrasta alhures”. Não é uma compulsão, mas um encontro cotidiano com seus ardores, em que o anonimato e o ilimitado representam as condições indispensáveis do seu gozo.
Estamos, com esses exemplos femininos, no que Lacan desdobra “em relação ao que designa gozo a função fálica, [como] um gozo suplementar”[8]? Para ele, ser uma mulher supõe consentir com esse gozo suplementar, uma vez ultrapassada a forma fálica de sua satisfação. Então, ela admite ser não-toda. Esse não-todo feminino retoma a dimensão de falta, de subtração, mas dessa vez de forma positiva. Pois esse gozo lhe é próprio e a faz mulher: “Há um gozo dela sobre o qual talvez ela mesma não saiba nada a não ser que o experimenta: isto ela sabe”[9].
As mulheres não sabem falar de seu gozo suplementar. Não por pudor, mas porque esse gozo não se serve do significante para operar. Aparece muito claramente, nas tentativas de testemunhos femininos, que esse gozo propriamente feminino tem aderências muito potentes com o registro do real, aquele onde a linguagem encontra seu próprio limite. Lacan escreve esse fato de estrutura que orienta a sexualidade feminina: S (Ⱥ). Tanto o registro fálico faz evoluir o sujeito no universo simbólico e imaginário, como esse Outro gozo, feminino, envolve as mulheres em um mundo onde seus corpos estão imbricados a sê-lo fora da representação significante. Essa provação feminina é a consequência da impossibilidade da língua em enunciar um “universal da mulher”.
O mundo do real as transporta sobre as bordas onde elas se mantêm em desequilíbrio. Abismo e nada, mas também êxtase e raiva formam os extremos onde se sustentam seus modos de gozo. Isso explica a grande heterogeneidade de figuras femininas. Fraca, frágil, pobre, muda, apagada, chorosa, inculta, desesperada, devastada, ou bem dedicada, inteira, excessiva, exaltada, mentirosa, implacável… a lista é sem fim. Esse múltiplo substitui a enunciação impossível de uma identidade feminina.
O mundo feminino é como uma anamorfose em um quadro. Aí onde a representação fálica obedece a uma ordem de satisfação se incrusta um Outro gozo que faz figura de sem-sentido, até mesmo de bizarrice inquietante. Há que se colocar em um certo lugar onde uma mulher aloja seu gozo para escutar o que ela diz disso. A imagem da anamorfose figura bem como o real com o qual ela se confronta para experimentar seu gozo é, apesar de tudo, inscritível no mundo sensível, mas como uma anomalia na representação que ela faz de si própria. O Outro gozo para uma mulher a situa acima de tudo como Outra para si mesma. Ela é uma estrangeira no seu gozo; isso a ultrapassa, sacode, conduz, invade, transforma, arruína.
Uma é ultrapassada pela solidão que a deixa sempre desertada, seja porque cai no fundo do abismo, seja porque se sente habitada por um silêncio estranhamente pleno. A outra é despossuída no orgasmo quando isso a joga em um infinito de gozo e no sem-limite de suas entranhas. A terceira é aniquilada por uma separação que a lança sobre uma “terra arrasada”. Há também aquela cuja ruptura com o “homem da sua vida” a conduz a “profundezas abissais”. A série dessas experiências femininas é estruturalmente infinita. Todas evocam aquilo de que o gozo Outro é feito: infinito, absoluto, sentimento de existência entre ruína e êxtase. Esses são estados potentes que parecem alojar o ser feminino sobre um eixo vertical entre entusiasmo e nada. Duas margens opostas sobre as quais a feminilidade transporta aquelas e aqueles que se vivem mulher à medida das experiências e encontros, bons e maus. Alguma coisa de vertiginoso no corpo e no ser é experimentado por elas nessas ultrapassagens.
O que pode se escrever do acontecimento de gozo
Por que falar de gozo?
É o corpo que conhece seus extremos. Um corpo tornado feminino, fendido. Ao escutar as mulheres falar, o corpo feminino é vivido como um espaço aberto nos dois extremos da boca e da vagina e furado em todo seu comprimento. As emoções, como os líquidos, o atravessam. Lágrimas, sangue, leite materno, vômito, diarreia, líquido amniótico, urina, esperma, elas descrevem como eles as infiltram, as submergem, ou simplesmente escorrem nele, fazendo-as mulheres gozadoras no tempo da viagem em seus corpos. Elas dizem como se sentem assim habitadas, invadidas e fendidas, tudo ao mesmo tempo. Como sua fenda se torna ferida ou envelope, o tempo efêmero do prazer benfeitor ou devastador. Uma vez que isso não dura, isso se impõe e se acalma. A sensação e o líquido possuem uma vida autônoma. O corpo como continente é instrumento desses objetos que são mais-de-gozo no sentido do último ensino de Lacan – aí para suprir uma falha estrutural, tão potente enquanto carga afetiva! Tudo parece se desenrolar em uma impressão de desequilíbrio onde a superfície de borda, mas também o furo, o vazio, tornam-se lugares viventes desse gozo. Essas experiências femininas se realizam com o sentimento de uma vertigem, que provoca tanto o suspense da queda, a intuição de um precipício sem limites, como a impressão de uma elevação extática. Essas experiências femininas não se realizam sem desespero, terror ou pânico. O sujeito feminino, nesses momentos de gozo, parece sem cessar pronto para sair da borda sobre a qual se mantém para se deixar ir ao encontro de uma ou outra margem.
Detectamos o gozo feminino nesses estados, não somente pelas comoções essenciais que proporcionam às mulheres, mas também porque lhes são necessárias. Elas repetem sem cessar as situações propícias a seu encontro. Elas as buscam, amiúde sem sabê-lo, como munidas de uma disposição profunda e incontornável. Lá ainda o real mostra bem que é ele que orquestra esse gozo feminino. Pois elas são conduzidas a zonas onde o sentimento de existir é confundido com a intensidade dos seus estados. Elas encontram seu ser muito singular. No momento em que elas experimentam o que sedia seus corpos, elas estão tanto em uma simbiose com elas mesmas como em uma estranheza que as carrega. Elas acreditam encontrar por isso uma verdade que nenhuma outra experiência lhes permitiria alcançar.
O amor é o registro que privilegia para as mulheres esses estados de absoluto. Um amor real, no sentido lacaniano, que deixa de lado os jogos de identificação, do ideal e do fantasma. Na história amorosa de uma mulher, há por vezes um homem que faz exceção, aquele que a fez mulher. Ele despertou o que parece ocupar na estrutura o papel que deveria ter o significante maior da feminilidade que falta. Eis porque podemos dizer que uma mulher ama o amor, um amor rigoroso, indispensável ao sujeito. Ela é mais parceira do amor que parceira desse homem. À falta de uma relação sexual que existe, algumas mulheres estabelecem uma relação de amor real em que a devastação e o êxtase entram em disputa. Sabemos o lugar que Lacan deu ao amor místico para esclarecer a relação entre mulheres e feminilidade: “[…] na medida em que seu gozo é radicalmente Outro que a mulher tem mais relação com Deus”[10]. Há nessa relação com o amor real alguma coisa de místico, de devoção, em que ela está prestes a perder tudo por esse amor. Nem os bens materiais, nem o prestígio, a moral, os filhos ou a conjugalidade, nada pesa face a ele. É um amor desnudado de toda ligação material. É unicamente um estado de graça que conta.
Para concluir, tomarei o exemplo de uma mulher cujo amor notável por um homem a conduziu ao fim de sua análise. Ela disse como esse amor comportou uma radicalidade indispensável e invivível. Como ele a propulsionou a limites existenciais, de zonas do real. Uma palavra da língua acabou por condensar sua experiência de gozo: a palavra “livre”. Ela dizia o que seu amor engajava de corporeidade, de ser e de sentimentos. Assim, ela reconhecia ter se “livrado” a esse amor. No momento da separação do homem amado, correndo o risco, pensava ela, de desaparecer com essa perda, ela deve se confrontar com a necessidade de “livrar-se” desse amor, mais que do homem. Ele, pelo amor que ela lhe tinha, a tinha feito mulher. Ela conheceu infinitos de gozo que ela ignorava antes dele. Nessas experiências, efetuou-se sem sabê-lo o que se operou na ruptura: uma subtração, a subtração de uma “libra de carne”. Ela estava aí no real, essa libra, desde sempre pronta a se desfazer de seu corpo. Ele a pegou para sempre.
Foi a análise que lhe permitiu inscrever essa subtração no seu ser. Ela permanece no seu corpo, como um pedaço retirado e perdido, traço do real da mulher que ela é. Temos aí uma nova definição do que Lacan designa por “privação feminina”, quando a feminilidade escapa do falicismo para encontrar uma forma onde o corpo toma a cargo o real. E o sublima. Eis porque lhe foi preciso escrever o “livro” desse amor para se “liberar” (délivrer) – entregar não significando, portanto, apagar, “liquidar” esse amor. Não se tornou um souvenir. Foi um acontecimento de gozo instalado no seu corpo, inscrevendo seu traço sob a forma de um vazio fechado e tranquilo.
Esse livro é esse fim de análise.
Assim, a análise pode agir sobre o real do gozo feminino e realizar uma mutação desse traço real do corpo em traço escrito no inconsciente.